sábado, 31 de dezembro de 2011
Queixa
Pela sua grandeza
Não sou o único culpado
Disso eu tenho a certeza"
Um Caetano talvez ajude a entender nós dois. Já que a essa hora não posso viver, compreender ou teorizar um pouco me basta para encontrar um nível de envolvimento menos insatisfatório.
Uma espécie de masturbação cardíaca, eu definiria.
Pra tentar acalmar o coração que te sente tardar; os olhos que buscam os seus em qualquer canto para descansar. Atentos, desatentos, negligentes.
Numa paixão desmaiada, em sono leve que lhe basta qualquer bobeira para despertar elétrica, te adio.
Adio um segredo mal guardado, mal revelado. Adio a coragem que suponho ter. Afasto. Aproximo-me.
Cativo um sonho mal vivido.
Vivo um sonho maltratado.
Sonho uma vida mal cativada.
Cativo de nós dois, deixo tanto potencial se tornar.
Só mais um amor mal resolvido.
Que novidade.
"E sonho esse sonho
que se estende
em rua, em rua
em rua
em vão."
sexta-feira, 30 de dezembro de 2011
Só uma experiência banal
domingo, 11 de dezembro de 2011
Memória
Acordou preguiçosa, rolou na cama como se tentasse apagar o sono e levantou séria, despenteada. Debaixo do chuveiro, espantou um diário zumbi do corpo. Ligou a cafeteira e ia separar a roupa do serviço quando se deparou com o calendário. 25 de agosto. Tem dia que dói ao ser olhado. Este era vermelho, diferente dos outros, pretos e quase todos riscados – fim de mês. Era diferente, este dia. Fazia exato um ano que seu pai morrera, num lugar bem distante dali.
Foi até a mesinha ao lado da sua cama e acendeu uma vela que iluminou de prima a fotografia meio batida de um senhor de olhos claros e cabelo branco, quase amarelo. A luz difusa da vela deixava apenas vestígios do azul latejante de sua colorida blusa. Suspirou ao congelado riso dele. Enquanto os fogos queimavam lá fora, ela, órfã e castrada do coletivo, só queria dormir em paz, sem pais. Amanhã, com o país esquecendo o motivo da festa, que existirá apenas em vestígios nos jornais, nas caras amassadas de ressaca, na memória, ela voltará a pertencê-los.
sábado, 3 de dezembro de 2011
domingo, 20 de novembro de 2011
Nada por mim
Acostumei-me ao teu corpo como por sobrevivência se adapta um bicho a um novo habitat e, por assim dizer, acabei tomando gosto pelo seu território. Primeiro procurei por instinto, a sabor ou dissabor, a qualquer custo suprir-te do que querias de mim. Só por fazê-la satisfeita assim, a troco de teu sorriso – em segredo: só o que eu queria.
Depois, pelos termos do nosso amor didático, comecei a suspeitar as maneiras de te saborear. Como se eu bicho aprendesse a comê-la feito fruta inédita. Estreando pela insípida casca e insistentemente passando a um curioso bagaço onde você me guiava para o seu íntimo. Daí finalmente, conduzido pelos seus calores, desvendava cada vez melhor o jeito certo de te provar. Na minha irracional sede, te devorava a polpa e engolia sorridente o caroço até que você pedisse trégua. Foram assim noites, intervalos, horários de almoço a te tomar enquanto eu passava de bicho a humano e então a dependente.
Apaixonei-me não só pelo sorriso, mas pelos caminhos para fazê-la sorrir. Mantendo o segredo, fiz da sua delícia o meu motivo – afinal, o que é melhor que ver a pessoa amada feliz?.
Não custou até que eu compreendesse o meu papel ao pé da cama. Até você me sorrir com o sorriso que eu te ensinara a sorrir e me propor que a deixasse em paz.
- Não faça assim.
Matheus
segunda-feira, 7 de novembro de 2011
quinta-feira, 3 de novembro de 2011
Ainda é tarde
Ela falou você tem medo
Aí eu disse quem tem medo é você.
Quem tinha medo era eu.
cedo, cedo, cedo, cedo,
tarde.
domingo, 30 de outubro de 2011
saroH
segunda-feira, 24 de outubro de 2011
O Pintor
Eu disse que tenho uma poltrona porque sua relação com a janela é das mais gostosas. Dá um ângulo pelo qual se vê mais céu e árvore que prédios e fios. A arte do homem aqui é antagonista à do céu. Exceto pelas vezes que o homem resolve criar janelas. Adoraria uma janela maior, mas dá pra ser feliz com essa daqui.
Aqui deitado na sala, observando as pinturas ao vivo do meu artista favorito, eu tenho a deliciosa sensação de não precisar de mais nada. Colocaria uma música, mas respeito o trabalho dos pássaros. Pra uma cidade de mais de 500 mil humanos, até que eles fazem mais barulho que o comum na minha casa. Quase não ouço os longínquos motores. Acho motores um desacato aos ouvidos.
Agora o céu desenhou um sujeito parecido com papai noel, só a cabeça, gorro e barba. Será que alguém mais percebeu?
Quando falam mal do seu trabalho, o céu costuma chorar, o que molha todo mundo. Quando o céu entra em depressão, uma galera pode ficar sem casa. É a natureza cobrando as contas do dito progresso. Talvez para as pessoas erradas. Cobrar de quem não tem não parece justo. Mas o céu contiua fazendo o seu trabalho artístico pra quem tem e pra quem deve.
Penso que o céu deve ter um bom patrocinador de tintas azuis.
Acenderam as luzes amarelas da rua, o dia está chegando ao fim. O céu tomou um ar triste.
Mas hoje não vai chover.
Matheus Marins
24/10/11
domingo, 16 de outubro de 2011
Improváveis
Matheus
sexta-feira, 30 de setembro de 2011
Sobre interpretar o tempo e observar o seu trabalho silencioso
segunda-feira, 19 de setembro de 2011
sábado, 13 de agosto de 2011
é melhor que caminhar vazio
sábado, 30 de julho de 2011
sonhos
Ato contínuo ao de acordar é esfarrapar sonhos em busca de sabores do que se vivia há instantes atrás. Até que se acha um gostinho, mas o terreno dos sonhos costuma empoeirar num instante... devaneios moleques, se desfazem, se refazem, repensam, desconstróem, criam, quebram, misturam... sem precisar de explicar. É preciso ser sagaz logo cedo se quiser saber da história mais ou menos certa.
O que fascina mais é que quando acordo de um sonho me vejo contando uma história pra mim outra vez... e de vez em quando conto tão bem que até me engano em onde o conto foi de pegar e onde foi de fantasiar.
Porém, o que perturba mais é quando esqueço do que me contei - sempre esqueço, pelo menos a maior parte - e não tenho mais pra quem perguntar, porque eu esqueci.
Dos sonhos, não costumo lembrar muito das cores, nem das falas. O enredo é vacilante... mas algumas partes sempre ficam marcadas. Exemplo: geralmente não esqueço dos sorrisos. São importantes ali. Não só ali! Algumas bocas, quando riem, podem até reverter pesadelo em sonho.
É bom que posso carregar comigo estes risos todos.
Acho bonito de morrer.
Vamos viver este mundo!
segunda-feira, 4 de julho de 2011
Amor bom é amor facinho
Há conversas que nunca terminam e dúvidas que jamais desaparecem. Sobre a melhor maneira de iniciar uma relação, por exemplo. Muita gente acredita que aquilo que se ganha com facilidade se perde do mesmo jeito. Acham que as relações que exigem esforço têm mais valor. Mulheres difíceis de conquistar, homens difíceis de manter, namoros que dão trabalho - esses tendem a ser mais importantes e duradouros. Mas será verdade?
Eu suspeito que não.
Acho que somos ensinados a subestimar quem gosta de nós. Se a garota na mesa ao lado sorri em nossa direção, começamos a reparar nos seus defeitos. Se a pessoa fosse realmente bacana não me daria bola assim de graça. Se ela não resiste aos meus escassos encantos é uma mulher fácil – e mulheres fáceis não valem nada, certo? O nome disso, damas e cavalheiros, é baixa auto-estima: não entro em clube que me queira como sócio. É engraçado, mas dói.
Também somos educados para o sacrifício. Aquilo que ganhamos sem suor não tem valor. Somos uma sociedade de lutadores, não somos? Temos de nos esforçar para obter recompensas. As coisas que realmente valem a pena são obtidas à duras penas. E por aí vai. De tanto ouvir essa conversa - na escola, no esporte, no escritório - levamos seus pressupostos para a vida afetiva. Acabamos acreditando que também no terreno do afeto deveríamos ser capazes de lutar, sofrer e triunfar. Precisamos de conquistas épicas para contar no jantar de domingo. Se for fácil demais, não vale. Amor assim não tem graça, diz um amigo meu. Será mesmo?
Minha experiência sugere o contrário.
Desde a adolescência, e no transcorrer da vida adulta, todas as mulheres importantes me caíram do céu. A moça que vomitou no meu pé na festa do centro acadêmico e me levou para dormir na sala da casa dela. Casamos. A garota de olhos tristes que eu conheci na porta do cinema e meia hora depois tomava o meu sorvete. Quase casamos? A mulher cujo nome eu perguntei na lanchonete do trabalho e 24 horas depois me chamou para uma festa. A menina do interior que resolveu dançar comigo num impulso. Nenhuma delas foi seduzida, conquistada ou convencida a gostar de mim. Elas tomaram a iniciativa – ou retribuíram sem hesitar a atenção que eu dei a elas.
Toda vez que eu insisti com quem não estava interessada deu errado. Toda vez que tentei escalar o muro da indiferença foi inútil. Ou descobri que do outro lado não havia nada. Na minha experiência, amor é um território em que coragem e a iniciativa são premiadas, mas empenho, persistência e determinação nunca trouxeram resultado.
Relato essa experiência para discutir uma questão que me parece da maior gravidade: o quanto deveríamos insistir em obter a atenção de uma pessoa que não parece retribuir os nossos sentimos?
Quem está emocionalmente disponível lida com esse tipo de dilema o tempo todo. Você conhece a figura, acha bacana, liga uns dias depois e ela não atende e nem liga de volta. O que fazer? Você sai com a pessoa, acha ela o máximo, tenta um segundo encontro e ela reluta em marcar a data. Como proceder a partir daí? Você começou uma relação, está se apaixonando, mas a outra parte, um belo dia, deixa de retornar seus telefonemas. O que se faz? Você está apaixonado ou apaixonada, levou um pé na bunda e mal consegue respirar. É o caso de tentar reconquistar ou seria melhor proteger-se e ajudar o sentimento a morrer?
Todas essas situações conduzem à mesma escolha: insistir ou desistir?
Quem acha que o amor é um campo de batalha geralmente opta pela insistência. Quem acha que ele é uma ocorrência espontânea tende a escolher a desistência (embora isso pareça feio). Na prática, como não temos 100% de certeza sobre as coisas, e como não nos controlamos 100%, oscilamos entre uma e outra posição, ao sabor das circunstâncias e do tamanho do envolvimento. Mas a maioria de nós, mesmo de forma inconsciente, traça um limite para o quanto se empenhar (ou rastejar) num caso desses. Quem não tem limites sofre além da conta – e frequentemente faz papel de bobo, com resultados pífios.
Uma das minhas teorias favoritas é que mesmo que a pessoa ceda a um assédio longo e custoso a relação estará envenenada. Pela simples razão de que ninguém é esnobado por muito tempo ou de forma muito ostensiva sem desenvolver ressentimentos. E ressentimentos não se dissipam. Eles ficam e cobram um preço. Cedo ou tarde a conta chega. E o tipo de personalidade que insiste demais numa conquista pode estar movida por motivos errados: o interesse é pela pessoa ou pela dificuldade? É um caso de amor ou de amor próprio?
Ser amado de graça, por outro lado, não tem preço. É a homenagem mais bacana que uma pessoa pode nos fazer. Você está ali, na vida (no trabalho, na balada, nas férias, no churrasco, na casa do amigo) e a pessoa simplesmente gosta de você. Ou você se aproxima com uma conversa fiada e ela recebe esse gesto de braços abertos. O que pode ser melhor do que isso? O que pode ser melhor do que ser gostado por aquilo que se é – sem truques, sem jogos de sedução, sem premeditações? Neste momento eu não consigo me lembrar de nada.
Ivan Martins
segunda-feira, 27 de junho de 2011
Seu Sorriso Derretia Satélites
Desta janela encoberta de neblina
Avisto seus brilhos solares atravessando a rua
Escondendo das lentes ofuscantes do sucesso
Seus passos decididos partiam em rotas inexistentes
Por um segundo, senti o bater ritmado do seu coração parar.
Como se o mundo parasse, se o ar faltasse.
Instantaneamente o universo retrocedeu duas décadas de evolução
Depois acelerou tão ferozmente que estrelas colidiram
Escuridão silenciosa fez em seu breve penar
Deste labirinto tortuoso que descrevo meus dias de exílio.
Observo, assustado, o correr natural de seus dias simples.
Como a um terremoto seus passos chocam com astros distraídos.
Destruindo o pouco de paz existente nos cosmos
Volte!
Por um breve instante, minha vida misturou-se com a sua.
Meus tristes relatos, observados com minhas vistas cansadas de esperar
a paz roubada, no instante que colidiu sua rota em meus dias cinzas
Os deuses festejaram a descoberta de uma constelação.
Deste quadro abstrato que minhas retinas incansavelmente entorpecem
Procuro vestígios palpáveis para reencontrar seus braços
Eu, vagando entre o real e o imaginário, suspiro a cada sonho.
Contrabandeando sorrisos puros a cristalizar nostalgicamente a vida
Desta caverna sombria a qual observo tudo contra a luz
Vejo-te flutuar pelo salão principal, deslumbrante e bela.
Ignorando as luzes ofuscantes, vejo apenas seus olhos brilhando,
no escuro opaco, reluzente luas prateadas em noites de euforia
Seu sorriso derretia satélites e corações gelados.
- Caio Fernando Abreu
domingo, 26 de junho de 2011
terça-feira, 21 de junho de 2011
Memória
Acordou preguiçosa, rolou na cama como se tentasse apagar o sono e levantou séria, despenteada. Debaixo do chuveiro, espantou um diário zumbi do corpo. Ligou a cafeteira e ia separar a roupa do serviço quando se deparou com o calendário. 25 de agosto. Tem dia que dói ao ser olhado. Este era vermelho, diferente dos outros, pretos e quase todos riscados – fim de mês. Era diferente, este dia. Fazia exato um ano que seu pai morrera, num lugar bem distante dali.
Inevitável lembrar da infância, dos olhos verdes, dos cabelos antes louros e ultimamente brancos, do jeito, momentos, tanta coisa. Lembrou também de tudo o que acontecera desde então e até a fizera se mudar para seguir adiante. Ainda novo, o lugar. Aí lembrou do relógio que, sobre o calendário, não parava. Lembrou que esqueceu do café. Estava atrasada. Mais um atraso seria intragável como o gosto do café perdido. Mas nenhum amargo lhe parecia tão forte quanto o amargo da falta. Correu.
Na rua o movimento era diferente, notou logo que saiu de casa. Todos pareciam mais alegres, descompromissados. Achou que fosse porque ela estava triste e cheia de afazeres, então a visão contrastava. Andou dois quarteirões para esperar pelo ônibus que deixava no centro da cidade e a estátua do primeiro presidente hoje não estava pichada. Logo depois de cruzar a roleta, lembrou que esquecera o crachá – outra vez. Simpatizou com o cobrador, que também não estava lá muito feliz. Sentou perto dele para se sentir mais em casa na sua melancolia. Meia hora depois, teve de saltar antes do ponto ideal porque a principal avenida da cidade estava fechada. Provavelmente algum acidente sério. Evitou de tomar a avenida mesmo a pé. Contornou-a a passos apressados e chegou ao edifício comercial cheirando a suor e ausência, quarenta minutos atrasada – tempo que gastara revirando a estante da memória. Engoliu o choro com uma bala dessas que vendem no ônibus e, quando ia entrando no edifício, tomou uma porrada não sabe de onde. Hoje não, pensou. Com o coração aos pulos, ela segurou suas coisas com força e deu alguns passos para trás, indefesa. Passaram-se segundos e nada aconteceu, foi quando teve coragem de olhar a sua volta e viu que não tinha ninguém. Nem do outro lado da rua. Tudo deserto. Só um som ritmado vindo da Avenida, não sabia o motivo da algazarra. Agora atenta, retomado o fôlego, ia ingressar no seu local de trabalho já assumindo a tristeza da falta. Foi quando viu seu reflexo se aproximar enquanto chegava perto da porta de vidro que bloqueava a entrada para o prédio. Havia dado com a cara na porta, compreendeu – que tola. Ainda bem que ninguém viu, pensou. Ao lado da porta, um papel colado informando “Em comemoração à independência, dia 25 de agosto não funcionaremos.”
Podia entender um pouco agora. Etnocentrista, achou que a causa da vermelhidão nas letras do calendário, que ganhara numa farmácia, era o primeiro aniversário da morte de seu pai. Saiu da rua deserta e caminhou até a avenida para ver o que se passava. O dia, motivo de orgulho na memória daquele pequeno país, era de festejar. Alguns usavam a data como pretexto para a farra, outros afirmavam discursos de integração nacional. Todos num só sentimento e ela voltou a se sentir estrangeira. Sem conseguir se integrar nem querer estragar a festa de ninguém, voltou para pegar o ônibus e mais um cobrador era triste, dependente. Em função das voltas que precisou dar e dos carros parados de qualquer jeito na rua, o ônibus demorou muito além do habitual e ela conseguiu chegar em casa quando o sol já queria começar a se por.
Adentrou seu lar e sentiu o odor de ausência. Ela com o cheiro da festa da rua. Precisou de outro banho e deve ter se molhado mais com lágrimas que com água corrente. Ligou no telejornal e reafirmou o que descobrira: dia da independência, integração nacional. Para ela, dia de saudade, de nó na garganta, dependente de uma memória que não poderia deixar para trás. Comeu algo a duras penas e, quando o dia escureceu, apagou todas as luzes.
Foi até mesinha ao lado da cama e acendeu uma vela que iluminou de prima a fotografia meio batida de um senhor de olhos verdes e cabelo branco, quase amarelo. A luz difusa da vela deixava apenas vestígios do azul latejante de sua colorida blusa. Suspirou ao congelado riso dele. Enquanto os fogos queimavam lá fora, ela, castrada da nação, só queria dormir em paz. Amanhã, com o país esquecendo o motivo da festa, que existirá apenas em vestígios nos jornais, na memória, ela voltará a pertencê-los.
Matheus
sábado, 18 de junho de 2011
Rakushisha
O cachorro parece um labrador e olha para mim quando me aproximo.
Tem uma cara afável. Somos ocidentais nós dois, amigo. Se bem que você talvez tenha nascido aqui, não é? Nasceu? No canil de um criador? Claro, onde mais, você me responde, com a paciência dos labradores.
Eu não nasci aqui. Não sei se você está muito interessado em saber. Sou do outro lado do planeta. Pode-se dizer que vim escondido dentro da bagagem de outra pessoa. É como se eu tivesse entrado clandestina, apesar do visto no meu passaporte. De fininho, para que não me vissem, para que não vissem as coisas invisíveis que eu trazia na mala. Que ninguém me veja ainda, que ninguém suspeite. Nesse sentido sou bem mais ocidental do que você, amigo de capa amarela. Não pertenço a este lugar.
E por que exatamente estou aqui, então, você poderia me perguntar se tivéssemos mais tempo para trocar olhares, se a sua coleira e o seu dono já não fossem te puxando para as suas obrigações - sejam elas quais forem, acompanhar, guiar, divertir.
Não sei muito bem, para ser honesta. Estive reaprendendo a andar. Estou reaprendendo a andar. Depois da tempestade, da era glacial, da grande seca, a gente pode usar a imagem que quiser, ninguém vai se importar muito, afinal, quem somos nós se não menos do que anônimos aqui. Abriu-se esta porta. Agora não dá tempo de te contar como aconteceu. E ainda não sei se andar equivale a lembrar, se equivale a esquecer, e qual das duas coisas é o meu remédio, se nenhuma delas, se nenhuma opção existe e se andar é o mal e o remédio, o veneno que tece a morte e a droga que traz a cura. Se vim para lembrar - se vim para esquecer. Se vim para morrer ou para me vacinar. Talvez eu descubra. Talvez nunca seja possível descobrir, desvelar, levantar o toldo, remover qualquer traço de ilusão de caminhar.
Seja como for. É só colocar um pé depois do outro.
quinta-feira, 16 de junho de 2011
ruim
olvidadas continuam acontecendo.
Sentimo-las como da primeira vez,
sentimo-las fora do tempo,
nesse mundo do sempre onde as
datas não datam. Só no mundo do nunca
existem lápides... Que importa se –
depois de tudo – tenha "ela" partido,
casado, mudado, sumido, esquecido,
enganado, ou que quer que te haja
feito, em suma? Tiveste uma parte da
sua vida que foi só tua e, esta, ela
jamais a poderá passar de ti para ninguém.
Há bens inalienáveis, há certos momentos que,
ao contrário do que pensas,
fazem parte da tua vida presente
e não do teu passado. E abrem-se no teu
sorriso mesmo quando, deslembrado deles,
estiveres sorrindo a outras coisas.
Ah, nem queiras saber o quanto
deves à ingrata criatura...
A thing of beauty is a joy for ever
disse, há cento e muitos anos, um poeta
inglês que não conseguiu morrer."
sábado, 11 de junho de 2011
Intro
Do jeito dele de chegar olhando bonito pros outros. Nem de baixo nem de cima, mas pelo mesmo nível, mostrando que não se considera melhor que ninguém. Um olhar consciente, interessado e interessante. Sabido de que nem tudo que ver vá ter uma explicação ou lógica. E despreocupado de buscar realidade em tudo. Finalmente, um olhar sem localização exata, porque às vezes enxergava por outros meios o que não era visível aos olhos. E um olhar verdadeiro, um mergulho em sabores de estrada, de amigos, de noites quentes, de corações partidos. Um olhar interminável, motivo pelo qual não consigo terminar esta descrição. Um olhar injustiçado pelas palavras que uso para descrevê-lo, posto que não poderiam nunca ser repetidas no mesmo texto, uma vez que também o seu olhar jamais se repete.
quinta-feira, 26 de maio de 2011
Reflexão de segunda
segunda-feira, 23 de maio de 2011
Busca Implacável
Amanhecia. E porque amanhecia ele precisava fazer tudo novamente: cheirar bem, vestir uma roupa limpa, não se atrasar para bater o cartão... Se ele não cumprira o dever estabelecido para a noite –dormir-, não importava. E não o cumpria há quatro dias. A sensação era de que não sonhava há séculos. Não conseguia sonhar, nem acordado. No apartamento agora vazio, vendo a cidade de São Paulo pelo 13º andar, olhava pela janela só pra ver se não achava um resto de sonho expulso por algum cidadão desnorteado pelo despertador. Depois, olhava janela abaixo por alguns minutos mas acabava concluindo: “saída pra covardes”. Fechava a cortina para abafar a realidade e ia preparar seu café. Muitó pó, água quase nenhuma. Ficava um líquido meio poroso, amargo independente de quanto açúcar colocava. É assim que ele gostava. Depois de uma dose dessas, molhava as mãos na água corrente e apertava os dedos gelados contra as pálpebras: “Eles jamais me derrubarão”. O gelado não estava só nos dedos, estava na alma e nada nem aquele café quente consegue esquentar.
Passa noite, dia, madrugada e a vida dele continua fora da órbita, imersa naquele caos, tão familiar. Levanta pesado para tentar viver mais um dia, nos olhos o disfarce de alegria.
Não agüentava o peso.
Anos se passaram enquanto ele tentou se encaixar. Começou a caçar um destino, importância demais para algum lugar suportar... Pretendia compensar o resto de vida.
Mas na mochila....Ele já sabia o que precisa levar. Pegou alguns clássicos, outros livros ainda não lidos. Não queria levar nada da sua vida antiga....Talvez levasse só as idéias. Levou 2 mudas de roupas, um casaco e algumas cuecas.
Ainda não podia supor para onde ia, nem quando ia voltar. Escreveu bem rápido um bilhete e prendeu na porta. Saiu, naquele horário habitual, no seu mundo ainda era dia.
Pegou o ipod queria uma música. Não escolheu nada. Não era bom com escolhas, nada parecia servir para aquele momento.
Desceu a Augusta hesitando se devia continuar, cogitou voltar correndo e se esconder debaixo das cobertas mas seu pensamento gritava ‘’você não pertence a este lugar’’
Chegou no ponto e o vento da madrugada batia nos seus cabelos, a cidade agora parecia tão diferente, parecia mais real.
Pegou o primeiro ônibus rumo ao aeroporto.
Matheus e Isabelle
domingo, 15 de maio de 2011
Um pedaço que falta
quarta-feira, 11 de maio de 2011
ect
Desculpe a demora em escrever. Mas te conhecendo a fundo como suspeito conhecer, sabia que você me esperaria com aquele velho otimismo quase clichê:
- "se já esperei por ele tanto, tanto, tanto, quer dizer que não vou ter que esperar mais muita coisa. quanto mais eu espero, menos eu vou ter que esperar. é."
Desculpe também essa língua solta, meio sincera demais. As palavras devem chegar aí suadas de tanto correr, que elas estão anos atrasadas.
Mas olha, achava que te esquecia com o tempo. Que nosso amor seria como um sol se pondo, bonito de doer, porém efêmero e abrindo as portas para a escuridão. Por isso quis congelar o pôr do sol e guardá-lo no bolso assim como estava: lindo, inofensivo. Talvez agora lendo você ria, divertida, lembrando do meu medo do escuro quando eu pedia para deixar uma brecha da porta aberta vazando luz pra dentro do quarto enquanto a gente dormia. Talvez não. O que importa é que, depois de tanto sol se pondo, estou pronto para tirar esse amor do bolso e encarar a noite contigo. Daí amanheceres e tudo cíclico, que quando chover também vou estar do teu lado, ardido dos sóis e das bebidas fortes da sua terra.
A sua falta me deixou um pouco tonto... ou talvez tenha sido o rum. Penso que posso estar escrevendo tudo isso em vão. Quiçá minha letra não esteja mais no seu alfabeto e você já não entenda quando balbucio saudades sem condições. Meu sentimento pode estar banido do seu vocabulário, assim como eu, que porventura você não tenha conseguido parar de esquecer desde que fui embora. Esse coração míope de quem não enxerga futuro em nada provavelmente não me tenha perdoado.
Seja como for, como anda você? A imaginação prega peças na gente. Às vezes penso cada coisa...
Seja como for, eu volto logo, me espera. Chego pouquinho depois desta!
Foi numa sala de ECT do Rio de Janeiro que jazia mais uma carta que, em tempos de e-mail e sms, voltou e rebateu nas mãos sujas de carimbo de um funcionário curioso fazendo hora extra. Amassada, atrasada, descuidada, suada, duvidosa com palavras que não paravam de correr.
segunda-feira, 9 de maio de 2011
Tarifa: R$ 2,50
quinta-feira, 5 de maio de 2011
terça-feira, 3 de maio de 2011
Vitória?
domingo, 1 de maio de 2011
Primeiro de maio
E ele apressa a caminhada
Pra acordar a namorada logo ali
E vai sorrindo, vai aflito
Pra mostrar, cheio de si
Que hoje ele é senhor das suas mãos
E das ferramentas
Ela acorda mais bonita
Sua pele é sua chita, seu fustão
E, bem ou mal, é seu veludo
É o tafetá que Deus lhe deu
E é bendito o fruto do suor
Do trabalho que é só seu
O dia inteiro pra se amar tanto
Ele, o artesão
Faz dentro dela a sua oficina
E ela, a tecelã
Vai fiar nas malhar do seu ventre
O homem de amanhã
sábado, 30 de abril de 2011
Centésimo cafézinho
terça-feira, 26 de abril de 2011
contundentes delicadezas 1
quinta-feira, 21 de abril de 2011
terça-feira, 19 de abril de 2011
Do outro lado do tempo
segunda-feira, 11 de abril de 2011
Amargo
segunda-feira, 28 de março de 2011
Velho bandido
Serão bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo miseráveis os poetas
Os seus versos serão bons
Mesmo porque as notas eram surdas
Quando um deus sonso e ladrão
Fez das tripas a primeira lira
Que animou todos os sons
E daí nasceram as baladas
E os arroubos de bandidos como eu
Cantando assim:
Você nasceu para mim
Você nasceu para mim
Mesmo que você feche os ouvidos
E as janelas do vestido
Minha musa vai cair em tentação
Mesmo porque estou falando grego
Com sua imaginação
Mesmo que você fuja de mim
Por labirintos e alçapões
Saiba que os poetas como os cegos
Podem ver na escuridão
E eis que, menos sábios do que antes
Os seus lábios ofegantes
Hão de se entregar assim:
Me leve até o fim
Me leve até o fim
Mesmo que os romances sejam falsos como o nosso
São bonitas, não importa
São bonitas as canções
Mesmo sendo errados os amantes
Seus amores serão bons
domingo, 20 de março de 2011
Tempo vai, vento vem
E o vento leva.
Madrugada outra vez. No céu a lua cheia de noites vazias. Corre o tempo em câmera lenta. Passos apertados e, pelos dedos, cinzas de cigarros. Pelos devaneios, cinzas de lembranças. O tempo fecha, ameaça chover e o asfalto não molha. Sua vida tem sido assim: a iminência; não sabia mais de que. A expectativa por uma mudança, uma pessoa, outra fase, não importa. O que tiver de diferente por favor que piorqueissonãofica. Mas o mundo inteiro sabe que fica.
Foi quando começou a chover. Ele estranhou, pois queria mesmo um bocado d’água. Reduziu o passo até parar no meio de uma rua menos movimentada, plena reflexão. Deixou-se encharcar e viu que a água poderia limpar suas mãos das cinzas de um cigarro banal, porém jamais o aliviaria a lembrança - pelo contrário. Dentro da roupa molhada, primeiro vislumbrou-a correndo, divertida sob a chuva durante um carnaval qualquer. Poderia ter sido uma doce recordação, mas - embriagados devaneios - não soube precisar como ela era – cinzas – o que trouxe-lhe certa aflição. Olhando ao redor reconheceu que poderia já ter estado ali com ela. E desconfiou que talvez neste momento alguém a estivesse levando para correr em uma rua como aquela, numa cidade como aquela e com roupas como as suas. Voltou a andar. A chuva parou. Ela voltaria - não a chuva, ela.-? Pela noite, passou a acreditar possuir uma conexão com ela em outro plano e talvez por isso não soubesse definir nem lembrar quase nada além de seus sentimentos. Mas sabia que já estivera mais próximo dela. A reconhecia de alguma memória. Mirada pelo triste céu de São Paulo ou ardida das areias do Nordeste. Foi então que pensou uma solução: juntando as cinzas da lembrança, tentava elaborar a estátua mais bonita para apelidar com o seu nome – se lembrasse nome. Catava com as duas mãos, juntava e colocava monte sobre monte antes de começar a dar formas. Obviamente nem conseguiu terminar os pés. Cinzas são leves e insensíveis demais. Gostam de liberdade e seu maior amigo é o vento. E como ventava nos pensamentos desse cara. Talvez não fosse mesmo bom brincar com uma lembrança meio morta.
Contemplando uma velha amarga angústia, ele traçava a cidade na madrugada, agora afim de uma dose da bebida mais forte que encontrasse, para ajudar a engolir qualquer coisa presa na garganta. Sua sombra desfilando na luz amarela repercutida pelo asfalto molhado. E a vida ardendo entre sonho e realidade. “Afinal, ela existiu?”
Já arrastando o hoje na conta do ontem, vazio, esperava o amanhã trazer uma resposta.
Matheus Marins
20/3/2011
sábado, 12 de março de 2011
Um pedaço do céu
sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011
quinta-feira, 17 de fevereiro de 2011
!
Hoje, passado cerca de 1 mês, suspeito que a parte liquificada dos meus pensamentos correspondia à literária, de forma que doravante acredito ter a inteligencia de um travesseiro (digo um travesseiro ordinário e não o meu, beneficiado) para transcrever esses lirismos que pintam devaneios adentro.
Por precaução, passei a senha do blog para o mesmo e espero que ele faça bom proveito.
Att,
Matheus Marins
domingo, 30 de janeiro de 2011
O seu nome não sei
Esquecí no piano as bobagens de amor
Que eu iria dizer, não... Lígia, Lígia
Eu nunca quis tê-la ao meu lado
Num fim de semana
Um chopp gelado em Copacabana
Andar pela praia até o Leblon
E quando eu me apaixonei
Não passou de ilusão, o seu nome rasguei
Fiz um samba canção das mentiras de amor
Que aprendí com você É... Lígia, Lígia
Você se aproxima de mim
Com esses modos estranhos e eu digo que sim
Mas teus olhos castanhos
Me metem mais medo que um dia de sol
É... Lígia, Lígia
E quando você me envolver
Nos seus braços serenos eu vou me render
Mas seus olhos morenos
Me metem mais medo que um raio de sol
É... Lígia Lígia
quinta-feira, 6 de janeiro de 2011
Carlos Drummond de Andrade
domingo, 2 de janeiro de 2011
Sabe tudo
Não dá!
Porque quem dá mesmo
Não diz!
O homem que diz "vou"
Não vai!
Porque quando foi
Já não quis!
O homem que diz "sou"
Não é!
Porque quem é mesmo "é"
Não sou!
O homem que diz "tou"
Não tá
Porque ninguém tá
Quando quer...