domingo, 30 de maio de 2010

Justificam os meios

É outono e ela vai andando pelas ruas, dobra, corre para atravessar, sobe o degrau, paga uma revista, tem pressa para um café rapidinho antes do serviço, está atrasada outra vez, mas a chefe hoje ficou de vir mais tarde.

Ele confere que uma neve fina ameaça brotar lá do alto. Vai caminhando lento. Tem uns passos cansados, que mal o querem mudar de lugar. Atravessa com calma, ouve a buzina do carro ecoar. Coloca um pé sobre a calçada, o outro. Se eleva no degrau com cara de todo-dia. Folheia um livrinho, esconde o jornal e sai sem pagar. Vai entrando na cafeteria. Do balcão, procura a melhor opção, opta pelo simples cafezinho que vê uma moça atraente tomando enquanto apressada folheia umas revistas.

Ela termina o café, tem tempo para dar uma varrida na decoração com os olhos desassossegados, vai mirando até travar o olhar num homem bem vestido lendo jornal com cara cotidiana. Liberta os pensamentos presos, levanta e esbarra talvez sem querer nele. E deixa sua chícara cair, e a porcelana vai se espatifar, e vai dar o maior trabalho para a faxineira.

A chícara cai em cima dele, ele se assusta e derrama café na moça chorando em preto e branco nas páginas do periódico. Respinga um pouco mais no jogador de futebol comemorando, e o líquido preto vai descendo até o seu sobretudo, e a chícara termina seu percurso até o solo, e tudo acontece tão rápido, e ele ainda tão lento. Ele, num arroubo, se sacode e sente a arma escorregar. Olha o chão, lá está. Aquela nove milímetros por cima de toda a porcelana espatifada. Ele só pensa em jogar o sobretudo por cima daquela festa e parece um louco se oferecendo para limpar e pedindo para ninguém chegar perto. Cata tudo e faz da vestimenta uma grande bolsa. Por que ele não usou o jornal?

Ela se desculpa, acusa seu jeito sem jeito, implora, é desculpada mil vezes, ri, percebe ele tentando ser natural sem conseguir, pois usa um sobretudo novo para limpar o chão. Desconfia que esteja inseguro pelo fato de ter se sentido atraído, e ele pode ser tímido. O acha gentil e deixa seu número, convidando para sair mais tarde, depois do serviço. E ele precisava mesmo de uma fachada para tanta alegoria disfarçada.

Ele perdoa, ri sem graça, sua frio, perdoa mil vezes, dá um riso amarelo, tenta manter a compostura com os cacos brancos e o volume de ferro pesado dentro daquele embrulo tosco. Se demonstra vulnerável e a verdade é que ela é mais uma a qual deseja mas não consegue tentar nada, transbordado por outros objetivos mais imediatos. Porém percebe utilidade, e sabe que não é só o seu coração traidor que pede atitude.


(...) E uma pessoa é enganada.


Ela vai tentando girar a chave para sair, as duas mãos cobertas de sangue. Não tem muita força, a bolsa é pesada, e a porta está emperrada, o sangue escorre por suas mãos para o metal da chave, goteja no piso e se espalha feito uma louça a se espatifar.

Ele está desnorteado, sangra mais que ela, vai correndo o apartamento a procurar. Cadê? Precisa daquele dinheiro na bolsa para pagar a cirurgia da mãe de seus filhos. Retirar uns três caroços que colocaram tudo de ponta-cabeça.

Matheus Marins Alvares - 30/05/2010

sábado, 29 de maio de 2010

Rockz


Gosto dessa banda.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Tentativa de roteiro 1

Ele: - Isso é por causa do Romário, não é?
Ela: - Claro que não! É por você, apenas.
- Queria tanto que você ficasse...
- Paulo, a situação ficou insuportável
- Sei que errei feio, meu bem. Garanto que não acontece de novo. A partir de agora vamos conversar mais, deixar as coisas claras...
(Silêncio)
Ele: Passo até no seu trabalho no horário de almoço.
Ela: Nem pense em voltar no meu trabalho! Todos já estão desconfiados, me olham torto e tudo! (Exaltada)
Ele: -E quem é que se importa? Você já está querendo dar do pé de lá e ir para Nevada de vez mesmo...
- Um dia eu volto, quem sabe. E aí? O pessoal todo vai lembrar que meu marido me traiu com o meu chefe?!
- Não fala assim...
- Por quanto tempo me escondeu isso, homem? Todos os 8 anos que estivemos juntos?
- Sempre tive receio de sua reação. Mas juro, com seu chefe foi a única vez! Fora isso, há anos que não acontecia.
- Sei...
- Verdade! Verdade!
- Você deveria buscar o que te faz feliz.
- É exatamente o que estou fazendo (soluçante).
- Achei que fosse aceitar melhor.
- No início foi mais fácil... Aí pensei nas manhãs sem ter a quem acordar, o telefone sem utilidade, as noites sem você e seu chá de camomila...
- Desapego, Paulo! Quem errou foi você. Vamos dar um tempo e, quem sabe um dia volto e te faço uma visita.
- Quanta frieza...
(O ônibus com direção a Nevada desponta na entrada da rodoviária, ela se apressa).
Ela: -Vê se ao menos me ajuda a levar essas malas.
(O ônibus de viagem estaciona, a porta se abre, passageiros desembarcam e é a vez dela entrar).
Ele: -Me liga quando chegar.
(guardando as malas).
Ele: - Não esqueça o remédio de enjôo.
(primeiro degrau)
Ele: - Deixei uma lembran...
(fecha-se a porta do ônibus, ela nem se despediu. Ele fica só, na rodoviária, assiste o ônibus em retirada e volta para o apartamento).

CENA 2

Uma semana depois, Paulo no apartamento ligando para a mãe dela.

Ele: - Alô? Ângela? Oi! Sou eu, o Paulo; faz uma semana que sua filha foi embora e não consigo qualquer contato, estou preocupado; ocupada?! Não pod...
- Tum, Tum, Tum. (Ângela bateu o telefone).
(Paulo fica preocupado e resolve investigar. Não consegue nada no antigo trabalho dela, que aparenta estar fechando as portas).

CENA 3

Dois meses depois, Paulo encontra uma conta no apartamento que dá para um endereço em Nevada.

Ele: - Deus do céu!
(gagueja qualquer coisa)
Ele: -É minha chance de rever meu amor. Vou pra lá amanhã mesmo! (falando sozinho)
(Paulo vai para a cama e não consegue dormir. Levanta, deixa o apartamento bagunçado e parte para a rodoviária).

CENA 4

Na rodoviária e, depois, dentro do ônibus

(Paulo está com o bilhete e embarca. A viagem é longa: 16 horas)
15 horas depois:
Rádio local: - Seguros e previdência UNILESCO: A sua melhor opção!... (UNILESCO é o nome da empresa onde ela trabalhava).
Ele: - Então era isso?! A empresa toda mudou para Nevada e ela não contou? Deve continuar trabalhando lá...
Um passageiro: - Quero dormir, cale a boca!

CENA 5

Paulo chega, toma um táxi até o endereço indicado na conta e, ao chegar, vê uma grande casa. Aproxima-se, analisa, vê um varal na lateral, onde Poe ver roupas que são dela e Paulo tem certeza de ter acertado seu paradeiro.
Paulo toca a campainha (barulho de duas pessoas dentro da casa, ouve a voz dela).
Ela: - Sua vez de atender, amor!
A outra pessoa: - A essa hora da manhã... (responde uma voz familiar a Paulo).
A porta abre, é Romário, o chefe dela, vestindo pijamas.

Matheus Marins Alvares - 14/05/2010

*Faltou um diálogo do início que perdi. Se alguém achar que fez falta, avise.
**Não reparar na minha habilidade para escolher nomes.

segunda-feira, 24 de maio de 2010

Primeiro de Maio - Chico Buarque

Hoje a cidade está parada, e ele apressa a caminhada para acordar a namorada logo ali. E vai sorrindo, vai aflito para mostrar cheio de si que hoje ele é senhor das suas mãos e das ferramentas.

Quando a sirene não habita, ela acorda mais bonita. Sua pele é sua chita, seu fustão. E, bem ou mal, é o seu veludo, é o tafetá que deus lhe deu, que é bendito fruto do suor do trabalho que é só seu.

Hoje eles hão de consagrar o dia inteiro para se amar. Tanto ele, o artesão, faz dentro dela sua oficina. E ela, tecelã, vai fiar nas malhas do seu ventre o homem de amanhã.

Mais um texto que gosto muito. Esse é música, e de uma simplicidade que fascina. :}

sábado, 22 de maio de 2010

Se lágrima fosse de pedra, eu choraria.

Um mestre do verso, de olhar destemido,
disse uma vez, com certa ironia :
“Se lágrima fosse de pedra
eu choraria”
Mas eu, Boca, como semrpe perdido
Bêbado de sambas e tantos sonhos
Choro a lágrima comum,
Que todos choram
Embora não tenha, nessas horas,
Saudade do passado, remorso
Ou mágoas menores
Meu choro, Boca,
Dolente, por questão de estilo,
É chula quase raiada
Solo espontâneo e rude
De um samba nunca terminado
Um rio de murmúrios da memória
De meus olhos, e quando aflora
Serve, antes de tudo,
Para aliviar o peso das palavras
Que ninguém é de pedra

Paulinho da Viola - Bebadosamba

Primeira vez que posto aqui um texto que não é meu. E esse vale a pena!

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Post improvisado

Um exercício sobre escrever quase sem pensar.

Joaquina vive em uma vila distante da cidade, onde não existe internet, telefone e sequer luz. A vila está localizada no norte da Dinamarca, todos os habitantes se conhecem e convivem da forma que podem, nem sempre harmoniosamente, no ponto de vista deles.
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Certo dia, durante uma guerra entre a Dinamarca e a Holanda, porque o governante do segundo país chamou o do primeiro país de bobo:
Joaquina caminhava entre a mata tranquila, sentindo o vento que soprava de todos os lados e ouvindo aqui e ali um barulho de bomba. Joaquina não tinha medo de ser atingida, diferente de todos os outros moradores daquela vila.
Enquanto voltava para casa carregando flores, nossa personagem principal se deparou com um homem sujo e ferido. Era um soldado do exército holandês. Joaquina, sempre bondosa, tomou o homem pelo braço e desceu de volta para a vila ao lado dele. O levou para sua casa e tratou de tratá-lo. Processo que perdurou por 10 dias de assistência e comidinha na boquinha. Quando o soldado estava curado, e ainda sem dizer palavra, a guerra já havia terminado. É segredo que Joaquina não queria que o soldado fosse embora. Após tê-lo alimentado, vestido, tratado como um bebê, havia se apegado de diversas formas.
O soldado, que estava muito melhor na casa da moçoila, um dia resolveu sair vila afora, e achou o ambiente muito agradável! A maioria dos moradores o dizia algo que ele não entendia ao passar, mas eram sorridentes...

cansei. blerg!

Matheus Marins
17/05/2010

domingo, 16 de maio de 2010

Vida que segue


Um dia depois do mega evento cheio de artistas e caravanas protestando, ou não, em uma Cinelândia ensopada, acerca dessa coisa toda dos royalties de petróleo. Estava voltando do estágio e tive que parar com a câmera para registrar.

Particularmente, amo o centro da cidade do Rio de Janeiro, dentre outras coisas, por essa característica de cidade grande, onde todo mundo vai correndo, correndo, como que automaticamente, movido por algo mais que só o dinheiro. Talvez por um compromisso em fazer a cidade parecer séria, mesmo que instável e beirando sempre ao caos.

Andar diariamente em meio e junto a esses trabalhadores, mendigos, empresários, jornaleiros, jornalistas, putas, engenheiros, pivetes, drogados, caretas, gringos, vagabundos, vendedores, empreiteiros,... Sempre me faz pensar bastante.

E isso é bom. ;)

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Distâncias

Entreolharam-se ao se cruzarem na descida do largo e, dez passos adiante, ele olhou para trás buscando fitá-la. Dez passos adiante, ela olhou para trás na direção dele. A vinte passos de distância, os dois trocaram um olhar desacreditado de ter sido retribuído. Logo o contato visual cedeu e os dois se afastaram numa velocidade de dois passos por passo. Os pensamentos na direção oposta, indo um de encontro ao outro com avidez pelas suas verdades. A distância entre os pensamentos diminuía. Entre os corpos, aumentava constante. A distância que separava o pensamento dos dois foi extinguindo, extinguindo, até que cessou de haver. A dos corpos foi aumentando, aumentando, até o infinito de nunca mais. Os pensamentos se juntaram e formaram um só, ficando à média distância entre cada corpo que lhe pertencia. Os corpos ficaram separados eternamente, sem complemento e sem pensamento, lamentando não terem feito qualquer coisa à distância certa.

Matheus Marins Alvares
07/05/2010