terça-feira, 2 de dezembro de 2014

a maior garota do mundo

Sonhei com você
ontem à noite -

com a razão
que os sonhos
tem,
e a licença poética
do meu travesseiro,
que me desculpe
qualquer coisa
mas,
dos meus lençóis,
nem o do Anérica
acredita mais
quando devaneio que você
tá por aí
e qualquer dia vem

- ou foi agora
de manhãzinha?

Send me the pillow
The one that you dream on
And I'll send you mine

ao som:
The Smiths - Some Girls Are Bigger Than Others

quarta-feira, 8 de outubro de 2014

Final

(em ritmo de narrador de jogo de futebol)

Driblou o zagueiro
Passou a bola pro Pet
Devolve no meio
Recebe na frente

vai
Apontar pro gol
Matheus
Vem o volante na cobertura
quedriiible!

a torcida vai à loucura
Vai arriscar de dentro da área
Saiu o goleiro ficou
No caminho

Agora é só um toquinho
Vai encher o pé!
Olha o pé
Olha o pé
Olha o pé!!!
de papoula indo pro chão

Espatiiifa o vaso de dona Jandira

E agora amigo
Mudas as roseiras e as margaridas

Agora é só correr pro quarto

-
Outubro, 2014

quinta-feira, 21 de agosto de 2014

assinatura pendente

Entendi o que é a bênção quando tive a luz refletida e macia
Entendi as estrelas, porque tantas
Entendi os amantes, porque tontos.
Entendi Vinícius e Tom, que já devem ter estado ali absortos pela impossível palavra que não se alcança onde já chegamos. Impassível contraditória palavra que não aparece. a acuso e uso todos os meus verbos para tentar de inquantificáveis maneiras te trazer pro meu vocabulário, como naquela festa eu tentava te trazer os olhos aos meus sem enigma. Par de olhos nus na multidão desimportante desde quando eles nus estavam.
Palavra, irresistível vontade de nomeá-la.

Digamos apenas que entendi
a luz vem refletida de um olhar macio e vaga os meus abarrotados olhos
que descobrem enfim e novamente a clareza
de já não haverem visto demais.

sonho

Viver é viajar
E mais que isso, viajar está mais em viver do que na própria viagem.


sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Folheio antigas notas do coração pelo quarto
observo o que tenho e contemplo o cenário.

Penso
Deveria ter anotado a data
Como quem pensa
Sequer anotei a placa
daquele caminhão.

1 de agosto 2014

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Mistério das Flores - por Fernanda Moraes



















Ela pescava flores
delas tbm era feita
Eu olhava-a do alto da minha nuvem
que passeava no horizonte

quando desci pra tocá-la já não havia
mais o Rio de flores
havia cores estampadas
no que não via

Onde estaria?

Procuraria entre córregos, oceanos e mares
a espera que seu rio que estivesse desaguasse
em algum mar
Um rio não seca da noite pro dia

Eu cairia lá do alto e andaria no chão e
pelos ares só pra estar perto de vc dessa vez
mas vc não estava lah

Daria a eternidade se pudesse ter mais um dia
com vc, nele não deixaria sobrar um único 
suspiro que afagasse a sua volúpia


A eternidade por um dia valeria
a vida

Lembro de quando vc ficava sentada em seu barco
esperando flores no mar

Ainda passo por seu apartamento todo dia
mesmo sabendo que vc não mora mais lá

È um jeito estranho de dizer que tenho saudade
e de voltar no passado, enganando o presente
e dando uma banda no futuro

Nunca mais te vi e voltei pra minha nuvem
jamais descerei de novo
mas jamais me perdoaria
se tivesse ficado aqui
sem descer pra tentar
tocar seu céu

terça-feira, 27 de maio de 2014

ALHAMBRA - Jorge Luis Borges









Grata la voz del agua
a quien abrumaron negras arenas,
grato a la mano cóncava
el mármol circular de la columna,
gratos los finos laberintos del agua
entre los limoneros,
grata la música del zéjel,
grato el amor y grata la plegaria
dirigida a un Dios que está solo,
grato el jazmín.

Vano el alfanje
ante las largas lanzas de los muchos,
vano ser el mejor.
Grato sentir o presentir, rey doliente,
que tus dulzuras son adioses,
que te será negada la llave,
que la cruz del infiel borrará la luna,
que la tarde que miras es la última.

Granada, 1976.


A luminosidade de Granada percebida por meio de outros sentidos no poema escrito por Jorge Luis Borges quando, cego há já mais de 20 anos, volta a estar na cidade, desta vez com sua companheira Maria Kodama. Borges havia visitado Granada quando adolescente, com seus pais, havendo, como não é de se suspeitar, se apaixonado pelo lugar.
Conta Maria que "a impaciência com que Borges se preparava aquela manhã para a visita à Alhambra, antecipando-a das maravilhas das quais recordava bem e que ela ainda não havia visto, o deixava tão encantado por voltar e mostrá-las que até se esqueceu que estava cego."
Maria Kodama conta também do incômodo que ela sentiu ao cruzar uma das portas da Alhambra e ler uma placa de cerâmica com a escritura de versos de Francisco A. de Icaza:

"Dale limosna, mujer
Que no hay en la vida nada
como la pena de ser
ciego en Granada."

Borges, ao notar, a tranquilizou dizendo:
"Não se sinta mal. Você me apresentará a Alhambra com os olhos de outro Oriente." (fazendo alusão à descendência japonesa de Kodama).

O poema parece remeter ainda à última tarde do rei Boabdil na cidade de Granada, que, perdida, deve entregá-la aos reis cristianos.

segunda-feira, 26 de maio de 2014

Pata-Palo

Quando entrei no bar, a primeira coisa que me chamou a atenção foram aqueles olhos azuis enigmáticos. Desatento, tropecei nos meus próprios passos e dei de cara na primeira pilastra. Ninguém pareceu dar-se conta do meu dom para a autosabotagem, tão cheio que estava o lugar. Assim, perdi de vista os olhos azuis apenas os tendo fitado por tempo o suficiente para ficar envolto por seu mistério. Eram mais charmosos que belos, verdade. Talvez me reservassem algo, pensei. Mas o que não me reservaria nesse lugar tão novo? Embora houvesse algo mais ali, reconsiderei. Eu saberia reconhecer se voltasse alguma vez na vida a esbarrar com aqueles olhos. E apesar do sobressalto, deixei para revê-la ao acaso.
Fui pegar uma bebida enquanto o DJ do bar nos embalava em ritmos latinos desconcertantes. Sopro de metal, cerca de duzentas pessoas dentro do chocalho que era aquele bar. Todo mundo se sacudindo e as bebidas inacabáveis indo metade pro santo, metade pra dança, metade pro amigo, metade pro bêbado. O santo, de tanto brinde ficou ébrio, tirou o anjo da guarda para rodar e lascou-lhe um beijo no meio do teto do bar que agora era festa. Quando o som mudou para salsa e as pessoas não paravam  de se embolar é que descobrimos tratar-se de um terremoto o motivo de tanto rebuliço. Alcançar a porta era difícil e a saída disputada. Sem anjo da guarda nem nada, cada passo dependia de outros duzentos passos dispendiosos.
Quando o local foi por fim totalmente evacuado, algumas pessoas encontravam-se desacordadas e tentei ajudar, embora o meu estado de sobriedade aspirasse cuidados.
De olhos fechados, olhos de cães bêbados, não encontrei aquele olhar azul-enigma. Talvez os olhos estivessem desmaiados, pensei. E quando vi uma garota sendo levada por ambulância, cismei que poderia ser ela. Que poderia ser você.
- Eu sou o irmão mais velho dela, preciso ir junto!
Aguardei na sala de espera impacientemente até onde aguentei. Quando seus olhos se abriram, estavam fechados os meus. Apaguei na cadeira do ambulatório e você foi embora sem me avisar que tinha ficado bem.
Ingrata, pensei.
Mas você nem sabia.
Eu nem sabia se era você. Se era ela.
Consternado, fui procurar o endereço do meu hostel provisório, que me servia enquanto eu não conseguia moradia fixa na cidade.
O quarto, impessoal e impecavelmente limpo, serviu para tomar uma ducha. Quando eu ia saindo para um café na hora da siesta, notei que o dinheiro havia ficado na devastada roupa do dia anterior...
Imagine qual surpresa não foi a minha quando encontrei no bolso da esbórnia apenas uma nota remanescente.
Imagine o que não senti quando percebi que a nota era na verdade um pedaço de papel de receita médica escrito no idioma local com letra que não era de médico.
Eu precisava aprender espanhol.

quinta-feira, 22 de maio de 2014

Mujer que dice chau

Me llevo un paquete vacío y arrugado de cigarrillos Republicana y una revista vieja que dejaste aquí. Me llevo los dos boletos últimos del ferrocarril. Me llevo una servilleta de papel con una cara mía que habías dibujado, de mi boca sale un globito con palabras, palabras que dicen cosas cómicas. También llevo una hoja de acacia recogida de la calle, la otra noche, cuando caminábamos separados por la gente. Y otra hoja, petrificada, blanca, que tiene un agujerito como una ventana, y la ventana estaba velada por el agua y yo soplé y te vi y ése fue el día en el que empezó la suerte. Me llevo el gusto del vino en la boca. (Por todas las cosas buenas, decíamos, todas la cosas, cada vez mejores, que nos van a pasar.)
No me llevo ni una sola gota de veneno. Me llevo los besos cuando te ibas (no estaba nunca dormida, nunca). Y un asombro por todo esto que ninguna carta, ninguna explicación, pueden decir a nadie lo que ha sido.

— Eduardo Galeano, en Vagamundo y otros relatos

domingo, 20 de abril de 2014

Polipoética

as cores sem filtros
brincando de máquina de escrever
à base d'água que passarinho não bebe
brincando de pintar domingo
coloridinho
brincando de sexta feira pra sempre

de emitir nota fiscal:
somando a poesia que faço desses dias
subtraindo a correria.

quarta-feira, 9 de abril de 2014

Carta Anônima

Eu nāo tive culpa e nem ela. Aconteceu, gostaste de me imaginar em ti. Nāo há o que se fazer. Você me veio com um bilhete, um sorriso que sem querer desbaratou a morte. Com um zelo descuidado para mudar a órbita do coraçāo: bilhete asteróide. Palavras insuportavelmente poucas e simples escritas num papel de sorteio que você deixou e foi embora em seu cometa. Li o vazio do texto e levantei as orelhas, pegou na jugular do meu sono e me acordou pro seu lado. E as listras do seu vestido branco e preto deixaram rastros que pintaram a minha cara de todas as cores.

“…tinha suspirado, tinha beijado o papel devotamente! Era a primeira vez que lhe escreviam aquelas sentimentalidades, e o seu orgulho dilatava-se ao calor amoroso que saía delas, como um corpo ressequido que se estira num banho tépido; sentia um acréscimo de estima por si mesma, e parecia-lhe que entrava enfim numa existência superiormente interessante, onde cada hora tinha o seu encanto diferente, cada passo condizia a um êxtase, e a alma se cobria de um luxo radioso de sensações!”



Ergui-me de um salto.
Iminentes amantes efêmeros, era muito vulnerável ao seu perfume que sequer senti.
Passei a correr pelos bares dessa cidade a procurar sem qualquer pista por você e seu cometa para reclamar o bilhete, a delicadeza, o apreço, a atençāo no que você nāo disse:
- Olha, eu nāo posso fazer nada. Tenho um compromisso, você deveria pedir desculpas. Nāo falei logo porque rasguei o papel com seu telefone na hora, nāo posso fazer nada…
E te busquei dentro de tantas garrafas querendo uma satisfaçāo... Brindes sem sentido com pessoas estranhas e juro que nāo deixei uma gota sobrar no copo só para ter certeza. Como nāo deixaria uma gota entre suas pernas quando a encontrasse. Ah…
Eu teria todas as insônias se nāo te contasse…
…Que se eu pudesse arderia no sentimento de ler aquele branco no papel todas as noites.



Matheus Marins (+ trecho de Eçá de Queiroz em O Primo Basílio)

segunda-feira, 7 de abril de 2014

desproblema de sexta à noite

sexta feira, 20h50
7843958237382 estão se preparando para sair
928374932393920 ficarão em casa
um taxista espera a moça descer
meu afilhado espera o telefone tocar por mais um feliz aniversário
- se tocar não atende, hoje é pra mim.

sexta-feira, 28 de fevereiro de 2014

antes de confessar que ardo por confundir nossos delírios mútuos,

gosto de sentir se desabrochar o seu apego. o seu perfume solto se embaraçar nos meus pelos,
insuspeitos até voar a camisa
naquele dia doce
por um quarto de motel safado.
que quartos de motel sempre são.
e quando vou ver, já te contei
delírio.