segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Esquizofrenia Eleitoral

Na Carioca, desviando de placas numeradas que ostentam risos iguais, propostas de sonhos, números 13 134 4321 tantos, cabelo aparentemente duro, cabeça sem cabelo, barba por fazer, olhos cansados... E foi num desses risos que tropecei e me vi caindo sem graça, atônito, perdido em cima dos dentes brancos e da expressão maquiada querendo confiança. Eu entornando no largo pra dentro do riso impassível, progressista, maquinado, organizado. Fui ao chão. Levantei descomposto e o riso parecia agora se rindo de mim. Ajeitei-me e segui de fininho, sem dar muita confiança, que é pra ninguém ficar mais achando tanta graça na minha cara. Despistando os sorrisos sequentes, ciente de que essa fase logo passa.

Não! Isso não aconteceu comigo!

Matheus 27/09/10

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Queria escrever muito agora. Passaria a tarde inteira cortando palavras, lendo, costurando verbos, descobrindo sentidos, numa primavera confundida com outono, com as palavras caindo no papel feito folhas de uma amendoeira desvairada na calçada. Não posso. Estou atrasado e a rotina às vezes cai mal.
Como o alerta da minha mãe, que grita "Filho, uma e quinze, hein."
"Tá."

Talvez dentro do ônibus eu consiga fazer o mesmo. Terei lá uma hora, sem essa privacidade, claro, sem esse silêncio reflexivo, mas certamente com um excesso de tudo o mais, jogado janela adentro em cada esquina virada à direita, à esquerda, num caminho tão passado que já tem a minha cara. Ou sou eu quem tem a cara tão batida de tanto passar por esses cantos?

Seja como for, "Que seja doce."

Matheus 23/09/10

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Tragédia Concretista

O poeta concretista acordou inspirado. Sonhara a noite toda com a namorada. E pensou: lábio, lábia. O lábio em que pensou era o da namorada, a lábia era a própria. Em todo o caso, na pior das hipóteses, já tinha um bom começo de poema. Todavia, cada vez mais obcecado pela lembrança daqueles lábios, achou que podia aproveitar a sua lábia e, provisoriamente desinteressado da poesia pura, resolveu telefonar à criatura amada, na esperança de maiores intimidades e vantagens. Até os poetas concretistas podem ser homens práticos.

Como, porém, transmitir a mensagem amorosa em termos vulgares, de toda a gente, se era um poeta concretista e nisto justamente residia (segundo julgava) todo o seu prestígio aos olhos das moças? Tinha que fazer um poema. A moça chamava-se Ema, era fácil. Discou. Assim que ouviu, do outro lado da linha, o “alô” sonolento do objeto amado, foi logo disparando:

- Ema. Amo. Amas?

- Como? – surpreendeu-se a jovem – Quem fala?

- Falo. Falas. Falemos.

A pequena, julgando-se vítima de um “trote”, ficou por conta e, como era muito bem-educada (essas meninas de hoje!), desligou violentamente, não antes de perpetrar, sem querer, um precioso “hai-kai” concretista:

- Basta, besta!

O poeta ficou fulminado. Não podia, não podia compreender. Sofreu, que também os concretistas sofrem; estava apaixonado, que também os concretista se apaixonam, quando são jovens – e todo poeta concretista é jovem. Não tinha lábia. Não teria os lábios. Por que não viajar para a Líbia? Desaparecer, sumir… Sentia-se profundamente desgraçado, inútil. Um triste. Um traste.

O consolo possível era a poesia. Sentou e escreveu:

“Bela. Bola. Bala.”

O que, traduzindo em vulgar, vem a dar esta banalidade: “A minha bela, não me dá bola. Isto acaba em bala.”

Não acabou, naturalmente. Tomou uma bebedeira e tratou de arranjar outra namorada, a quem dedicou um soneto parnasiano. Foi a conta. Casaram-se e são muito falazes… oh! Perdão: felizes.


Luís Martins

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

- Você tem um cigarro?
- Estou tentando parar de fumar.
- Eu também. Mas queria uma coisa nas mãos agora.
- Você tem uma coisa nas mãos agora.
- Eu?
- Eu.

Caio F.

domingo, 12 de setembro de 2010

Parti ao teu encontro

Cinco anos, quem diria? Cinco anos que o seu olhar cruzou com o meu num lugar qualquer. O contato visual durou cerca de cinco minutos. É um minuto para cada ano, cara. Loucura. Tempo demais para se esperar por alguém. Eu fico me dizendo: "É loucura, é loucura." E acaba que me conformo no sonho que finda cada dia "Um dia, um dia". E vou levando essa esperança que se renova e se alimenta de luz fria. Periodicamente nos afastamos, é claro. Mas suas mensagens voltam a chegar. Volto a corresponder, voltamos a não oferecer resistência e meu castelo volta a afundar na areia doce das promessas de conto de fadas.
Por tudo isso tomei a atitude. Deixei os projetos de lado e parti ao teu encontro. Parti arriscando partir o peito já rasgado de tanto desencontro. Você duvidou, hesitou até o dia do meu embarque. Todos os planos estremeceram, ficou insegura e talvez mais que eu. Ensaiava uma desculpa. Verdade, não nos falávamos fazia tempo. Aquele intervalos periódicos pro coração acalmar. Mas não precisava tanto assombro. Arrumei a mala apenas com roupas, um bloco de papel e uma caneta.
Fiquei no mesmo hotel que antes, que visivelmente não fora reformado dentro dos últimos cinco anos, e fui encontrá-la. De primeira mão, não sei o que passou. Acho que, quando parti, deixei no Rio a parte falante e veio só o garoto tímido, ainda que caloroso, gesticulante. A parte interessante mesmo, acho que não trouxe. A não ser que você julgasse interessante tanto rubor... implacável, covarde rubor me colorindo a cara. Você estava tímida, também sem jeito e com uma expressão indecifrável. À nossa maneira, houve diálogo. E foi bem como no meu pesadelo. Como poderia você ter começado um noivado? Até entendo de não querer mais balanço, mas tínhamos tudo tão certo, tão ensaiado, tão aplaudido nos devaneios... pode ver, minhas lágrimas são cúmplice. Oh não! Elas também esqueci no Rio de Janeiro.
Partido, agora volto. Cinco anos e eu escolho o pior dia. Nem a deixei avisar, mas poderia me ter impedido, você sempre dava um jeito. Você sempre me surpreende.
Sei que pedirá perdão pelas coisas que acabou fazendo hoje e que eu, sôfrego, continuarei gostando de você. Da próxima vez te trago um cigarro, que num dos tragos você cospe esse babaca. E também um pouco de lágrima para degelar isso que se fez entre nós. A você, só tenho a oferecer o meu pior: esse músculo todo lascado e que não quebra. Vaso ruim não quebra mesmo, mas também não sustém flor. Mas por esses vasos de sangue, fica exposto à flor da pele o martírio do músculo todo lascado se contorcendo no gelo.
O frio pode até conservá-lo das medidas do tempo, mas o mantém incurável refém daquilo que não se mede.

Matheus Marins - 27/08/10

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Placebo (?)

É, médica, eu sei que a vida não é fácil e que é preciso estudar para aprender direitinho e passar nas provas, depois conseguir um bom trabalho e se dedicar, daí traçar tudo o que se quer e ser um profissional bem posicionado no mercado, com estabilidade e reconhecimento. Aquelas coisas. Sei que se te passarem um beep na madrugada interrompendo nosso sono, ou nossa insônia, você terá de atender porque há vida em risco. Mesmo sacrificando a vida que criamos, pois sua profissão será uma vida à parte. E cada um é tão importante como você ou eu. Sei. Não tenho problemas quanto a isso e reconheço a importância crucial de uma boa medicina sempre disponível à população. Isso é base para a sociedade. E eu aceito tudo isso, sem problema algum.

Então, médica... se eu deixar meu coração com você, cuida como se fosse o daquele paciente que passou por mil testes e doutores, sem que fosse diagnosticada solução pra essa taquicardia? Seja paciente com a disritmia desse músculo que aos pulos vai me saindo pela boca. Cuida, que com o tempo ele volta ao normal. E quando já não houver mais sinal de descompasso, mão suadas, palavras sumidas, eu vou embora como todo o paciente.

Talvez aí você me deseje outra doença pra voltar aos seus cuidados, só pelo costume. Mas, sinceramente, acho que nunca será coisa tão séria que volte a precisar de seus tratos então. A não ser que eu tenha uma recaída. Sei que você será paciente nesse caso.

Olha eu adiantando a coisa toda. Faço mesmo muito disso, de querer profetizar. Mas agora vamos aproveitar, enquanto... BEEP!.

Matheus Marins Alvares - 09/09/2010

domingo, 5 de setembro de 2010

...continuando no mesmo embalo, do oito ele sobe pro nove. Ah, se eu tivesse
essa determinação...



Tenho falado tanto do tempo... deve ser pelo tanto que tenho pelas mãos... tanto que nem sinto escorrer por entre os dedos...
Tenho todo o tempo do mundo. Mas não gosto de vê-lo passar.

Matheus - 5/9/10

sábado, 4 de setembro de 2010

Silêncio na madrugada
Escarcéu nos delírios.


-----ou


Silêncio na madrugada
Só se for lá fora.


-----ou


Silêncio na madrugada
Tic-tac fala mais alto
Continua ali.


Não soube me decidir por um..

Matheus Marins - 03/9/10